quarta-feira, abril 19, 2006

Dia 6: De Saka a Ersaf

Acordei pouco antes das 8:00 e apressei-me a escalar um dos montes circundantes. Queria capturar a grandiosidade do vale, ou melhor, a pequenez da nossa existência perante aquele panorama magnificente.
Sob a terna envolvência de duas elevações do jbel Yerene, velada pela magnitude titânica do jbel Mezgout, repousava a efémere e insignificante presença de cinco seres humanos e seus estranhos artefactos. Uma visão sublime que jamais poderemos fielmente retratar.
Regressei à minha condição e preparámos um thé a la ment com a menta que comprámos em Saka no dia anterior.
Arrumámos o material e iniciámos a jornada já por volta das 9:00.
Tentámos seguir os vestígios duma pista através das encostas do jbel Yerene mas, como se verificou, estava à muito abandonada e grande parte já tinha desaparecido.
Incertos da sua viabilidade, decidimos optar por seguir o leito seco do oued contornando o jbel por oriente.

Após cerca de uma hora a progredir suavemente sobre piso de cascalho, avistámos uma pista que fletia na direcção desejada e abandonámos o oued. Seguímos ao longo de um amplo desfiladeiro até alcançarmos uma planície imensa que nos permitiu rolar a bom ritmo.
Por volta das 10:30 já tínhamos passado pela aldeia de Ain Nkhil e, meia hora depois, atravessávamos a bacia plana e os campos de cultivo que se estendem pelas margens do caudaloso oued Moulouya.

Aproximei-me do oued e atravessei-o. Com cerca de 40 metros de largura, mas pouco profundo, de àguas cristalinas e fundo pedregoso. Junto de nós afunilava junto dum pequeno degrau erodido no solo que, ao aumentar consideravelmente a corrente e velocidade das àguas, criava uma espécie de rápido.
Saltei da moto e preparei-me para fotografar os companheiros. Sem dificuldades, foram atravessando o oued.
Por fim, o Tiago mandou-se às àguas. Quando estava quase a chegar à outra margem, a traseira da moto fugiu num pequeno slide e parou. "A corrente!" - exclamou. Acorri em seu auxílio e empurrámos a moto para a margem do oued.

Por contacto nalgum calhau a corrente tinha saltado da cremalheira e, cedendo à força com que se enrolou em torno do pinhão de ataque, partiu-se.
"Bem, já que não saimos daqui tão cedo, aproveito para tomar um banho!" - oportunidades destas são raras!
Enquanto o Tiago tratava de solucionar o problema, fomos todos tomando banho.
Algumas centenas de metros a montante, o motor duma bomba rugia ferozmente para desviar a àgua para os canais de rega. Junto dela, algumas mulheres e várias crianças. Pouco depois um simpático marroquino, aparentemente o chefe de família, estava junto de nós. Apesar de não falar francês tentou ajudar a soltar a corrente e, depois, prostrou-se no chão ao nosso lado observando atentamente os trabalhos de reparação.
Entretanto almoçámos. Eu optei por pão com paté e uma laranja.
Após mais de três horas de trabalho, o problema estava finalmente resolvido. Foi então a vez do Tiago tomar banho e comer.

Passavam das 16:00 quando retomámos a pista e continuámos a progredir para Sudeste, ao longo de pistas fáceis sobre a planície. Estávamos prestes a iniciar a etapa-maratona que nos levaria através do Plateau du Rekkam e necessitávamos de reabastecer de combustível e mantimentos.
Chegámos ao asfalto entre Guercif e Taourirt e interrompemos a rota. Tentámos mas, à falta de alternativas por pista, lá prosseguimos por asfalto para Taourirt.

Reabastecemos as motos, atestámos os jerricans, comprámos àgua e pão. Aproveitámos e lanchámos numa pastelaria muito bem arranjada. Bebemos chá e orientei-me com um crèpe avec mel. Luxos, a que devemos sempre dar o devido valor. ;)
Por volta das 18:45 deixámos Taourirt preparados para, no mínimo, 450Km de autonomia. Regressámos rapidamente ao local onde tínhamos abandonado a pista anteriormente e retomámos a nossa rota.

Por pistas duras e rápidas seguimos, ao longo de um gasóduto, para Sudeste. O Sol já estava baixo e era tempo de procurar local de pernoita.
Pouco antes do asfalto entre Taourirt e Debdou, nas proximidades da localidade de Ersaf, localizámos um baixio junto a uns terrenos de cultivo, à beira do gasóduto, que se prestava perfeitamente ao que pretendíamos.
Montámos o acampamento e, já com noite cerrada, jantámos. Mais uma vez a sandes de paté fez as honras acompanhada, desta feita, por uma conserva de lulas.
A jornada, apesar de curta devido às quatro horas de paragem forçada, tinha sido suficientemente rentável e estávamos já praticamente "às portas" do Plateau de Rekkam.
Não demorámos muito a recolher aos aposentos para mais uma merecida noite de decanso. Amanhã, vamos andar muuuuito bem! :)

Percurso do dia

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