domingo, janeiro 08, 2006

Dia 5: De Loulé a Sines

Acordei eram 10:15. "Raios" - o pequeno-almoço era servido até às 10:00.
O Nuno entrou no quarto já saciado e espicaçou-me o apetite! Apressei-me a comparecer na sala de refeições... mas nada mais que café já frio e sumo instântaneo havia disponível. Resignado com a fraca refeição, regressei ao quarto para arrumar a trouxa.
O Sol já ia alto e, em virtude do contratempo do dia anterior, tínhamos ainda muitos kilómetros pela frente. Decidimos abandonar as serras algarvias, nas quais teríamos que progredir à descoberta com o inevitável custo temporal, e avançar pela Via do Infante até Portimão.
O plano: apanhar as pistas conhecidas do Tróia-Sagres, a partir de Aljezur, e efectuar o percurso pelas areias até Sines. Era o elemento que faltava. Depois da terra batida e arenosa, da gravilha e muita poça do "Sado"; passando pelo barro, lama consistente e pedra solta do Alentejo interior; até às picadas pedregosas, lamacentas e escorregadias do Algarve; só nos faltavam umas boas pistas de areia para completar o "todo" do terreno que nos tínhamos proposto atravessar.

E lá avançámos descontraidamente pela auto-estrada que, gostemos ou não, até o Dakar tem destas coisas! :) Além do mais, "Todo-o-Terreno" forçosamente engloba o asfalto! E já chega de desculpas esfarrapadas... ;)

Talvez fosse perto do meio-dia quando parámos, na estrada para Monchique, à beira dum café. O Nuno já me tinha despertado os sentidos para umas tais sandes de presunto, do melhor que se poderia arranjar na região, e a curiosidade aliou-se à vontade! Que maravilha...imperdível para quem passe nestas bandas!
E, satisfeitos, lá continuámos a nossa rota rumo a Aljezur, sempre com a serra a encher-nos o horizonte, e com os caminhos a encher-nos os sonhos - "Quando é que cá voltamos para correr isto?"

Após Aljezur fomos ao encontro do track do Troska e, a partir daí, foi sempre a "enrolar punho" até Sines :) Exceptuando as vistas, sempre surpreendentes e refrescantes, nada de especial há a acrescentar...






No Cabo Sardão, tirámos a última "foto de família", infelizmente, sem o nosso companheiro Daniel.

Na falésia grave e escarpada, uma silhueta humana deslocava-se lenta e hesitantemente em direcção ao mar, parecia um praticante de escalada...

-"Espera... o tipo não leva uma cana de pesca?"
-"Com mochila às costas!"
-"É maluco!"

Sem qualquer segurança, bastava um pequeno deslise e este homem cairia duma altura de 30m sobre as rochas junto ao mar... valerá o "spot" de pesca tanto risco? É insano.

Mais adiante, os "três duques" lá guardavam a pista. Das três ou quatro vezes que já fiz este percurso, eles reunem-se sempre ali. Aguardam, pacientemente sentados, pelo avanço dos intrusos e, "in extremis", carregam sobre as motos! Isto é que é sentido de dever! O que, obviamente, tem pouco a ver com eficácia no seu cumprimento... :)


Posto isto, às 17:00 estávamos em Sines. Após lavármos as motos, separámo-nos e o Nuno seguiu o seu rumo para casa! Eu ficaria lá mais umas horas antes de fazer o mesmo.

E assim terminou a nossa viagem, um pouco curta mas muito intensa, pelo sul do nosso cantinho à beira-mar plantado. Tantos trilhos, caminhos e estradões; tantas paisagens, lugares e cenários; tanto para ver, sentir e viver... tanto ficou por fazer. Uma experiência que, certamente, se vai repetir... muito em breve, "inch'Allah"! ;)


Todas as fotos desta "expedição" estão disponíveis aqui.

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sábado, janeiro 07, 2006

Dia 4: De Alcoutim a Loulé

Bela noite de sono. Lá fora, estava um dia risonho e convidativo.

Apressámo-nos a tomar o pequeno-almoço na pousada. Pelas 10:00 estávamos a saltar para cima das motos, prontos para mais um dia de "verdasca", desta feita pelas terras do "Al-Gharb". O destino alinhavado para o dia era Monchique.
Deixámos Alcoutim, junto às margens do Vascão, seguindo um estradão recente que nos levavia ao paredão duma nova represa.
Poucos minutos depois alcançávamos, por mero acaso, a última zona espetáculo do Dakar em terras lusas. Inevitavelmente :) seguimos pela pista! As imagens seguintes dispensam comentários...




Com o ânimo ao rubro :) perdi os colegas de "prova" e acabei por ficar à espera junto a mais um riacho, passagem que me pareceu boa para mais umas fotos ;)
Esperei e desesperei, até que finalmente liguei e não tinha rede... continuei.
Já no topo da serra, lá apanhei rede e recebi a indicação do seu paradeiro: tinham perdido a pista algures e já estavam em Martim Longo. Apressei-me a ir ao seu encontro e abandonámos o imenso estradão-pista do Dakar. Seguiríamos então pelos verdadeiros trilhos da serra!

Vários kilómetros depois andávamos já a desbravar a serra, sem quaisquer vestígios de presença humana, em direcção azimutal a ténues linhas pedonais marcadas em cartas com 25 anos... o resultado era, simplesmente, espectacular!

Por entre o mato alto, o ar puro perfumado com aromas de jasmim extasiáva-nos os sentidos; a cada curva, o contentamento de mais uma descoberta; no topo dos montes sucessivos, a inspiração de mais uma vista cortante...



Até apanhármos caminhos fabulosos que serpenteavam pelos picos e vales do Caldeirão, num interminável carrosel de maravilha que nos cortava a respiração!


Lugares paradisíacos e de difícil acesso, devido à providencial falta de caminhos ;), onde uma moto é o veículo de eleição para quem se quer aventurar!

E assim fomos progredindo atrás do Sol, alternando cumes onde a vista era espectacular, com vales magníficos onde só apetecia ficar e montar o acampamento! Que pena não podermos parar no tempo...


O Sol já estava baixo e encontrávamo-nos novamente às portas da pista "dakariana", um pouco a sul do cabeço de Mú. O tempo escasseava e, se ainda almejávamos chegar a Monchique, teríamos de tomar um caminho rápido....
Com o alcatrão fora de questão, venha de lá o estradão! :)
A pista estava muito enlameada e escorregadia. Previam-se dificuldades para progredir por ali assim que o Sol se escondesse. O Nuno tomou a dianteira e eu fechei o pelotão.
Ainda não tínhamos feito 5Km na pista a bom ritmo... o Daniel, poucos metros à minha frente, entra mal numa curva muito elameada e escavada, perde o controlo da moto, caí desamparado contra a encosta pedregosa e começa a exclamar com dores!
Assustado, saltei da moto e corri para junto dele...
- "O que sentes, onde te doí?"
- "O braço... parti o braço!..."
- "Não te doi mais nada? As costas, o pescoço? Consegues-te mexer?"
- "Sim..."
- "Sentes-te bem?"
- "Sim..."
Retirei-lhe a moto de cima e apressei-me a chamar o 112.
- "Vou desmaiar..."
- "Não vais nada!" - e despertei-o enquanto o ajudava a imobilizar o braço.
Deitado no chão com dores, pediu-me a última coisa que pensei possível:
- "Tira-me uma fotografia... para se ver onde foi!"
Perplexo, tive que me render à sua insistência!...

Após alguns minutos, ligam-me os bombeiros de Loulé. Expliquei-lhes onde estávamos e, azar, não era a sua jurisdição! Novamente liguei para o 112 e, desta vez, especifiquei claramente que deveriam encaminhar a situação para os bombeiros de Almodôvar.
Entretanto ajudámos o Daniel a levantar-se. A temperatura descia drásticamente e teria de se manter em movimento para não arrefecer demasiado. Já com peúgas e sapatilhas secas, lá começou a andar dum lado para o outro.
Entretanto, liguei para o seguro para accionar um reboque. Após a burocracia do costume, lá nos disseram que iriam enviar alguém para buscar a moto.
Obviamente, teríamos de arranjar forma de a colocar no alcatrão, mas isso era uma questão menor!
Não sabíamos bem qual era o estado da lesão do Daniel nem quanto tempo demoraria a ambulância a chegar, se é que conseguisse ali chegar!
Recebo, finalmente, a chamada dos bombeiros de Almodôvar. Combinei encontrar-me com eles no alcatrão para os orientar, junto à entrada do estradão. Peguei na moto do Daniel e fui ao seu encontro.
Assim que chegaram, deixei-a no alcatrão e enfiei-me na ambulância.
Lá fizémos, com alguma dificuldade, os 5Km pela pista fora até os encontrarmos.
O Daniel já se sentia nitidamente melhor a lá se enfiou na ambulância, junto com as suas bagagens, a caminho de Beja com "escala" no CS de Almodôvar.

Entretanto a seguradora ligou para mais uma dose da sua adorada burocracia. O importante: assegurariam o táxi para levar o Daniel de Beja para Lisboa.
Com o Daniel, já estamos mais descansados...

Passou mais de uma hora e nem sinal do reboque. No alto da serra a noite havia caído. Tínhamos os pés ensopados e estávamos a gelar.
Ligámos novamente à seguradora e fomos informados que já haviam despachado um reboque há meia hora e que já deveríamos ter sido contactados!
Estupefactos, aguardámos... ao frio.
Finalmente, contactaram-nos com a "novidade" de que o tipo se havia "baldado" e não encontravam nenhum reboque disponível na região... teria de sair um de Ourique.
Esperámos... e congelámos. Gelados, esperámos um pouco mais. Estávamos há quase 3 horas ao relento.
Naquele serão criogénico, descalcei as botas alagadas e desatei a correr no asfalto para ver se aquecia os pés um pouco...
Esperámos... e quando estávamos mais que fartos de esperar, esperámos um pouco mais.
Decidimos esconder a moto do Daniel e seguir uns kilómetros à procura dum café.
Encontrámos um a cerca de 6Km para sul. Já havia lá chegado a notícia duma ambulância que andava pela serra e duma moto parada junto ao asfalto, com a GNR ao lado! Parece que quando a ambulância chegou ao asfalto já lá estava a GNR, mas foram-se embora antes de nós chegarmos!
Impressionante... até já sabiam mais que nós!
Já nós estávamos a salivar com a possibilidade de despachar uma linguiça assada quando liga o motorista do reboque: "Estou aí em 20 minutos!" - Lá esquecemos a linguiça...
Regressámos ao local e aguardámos...

"ALELUIA! Lá vem ele! Só demoraram 4 horas!!..." - Estávamos alucinados...
Já devíamos ter zonas do cérebro petrificadas e o raciocínio já não era o melhor! Era só rir...
O motorista era um tipo jovem e cheio de vida! Alegremente, carregámos a moto enquanto sonhávamos com pés secos e quentes, comida gostosa e quente, cama confortável e quente, quente...

O Daniel manteve-nos ao corrente da sua situação e, por volta da hora em que despachávamos a sua moto, já ele tinha tido alta do hospital em Beja com um diagnóstico mais animador: luxação do cotovelo. Séria mas, felizmente, não tinha nada partido.
Ficámos bem mais tranquilos.
O motorista risonho, mecânico de profissão, também ele amigo do TT das 4 rodas, imediatamente começou a desbobinar as suas aventuras com o Vitara todo preparado... delicadamente, tivémos de o "enfiar" na cabina e "mandá-lo" para casa! Noutras circunstâncias seria uma boa companhia. Na presente situação, era um obstáculo entre nós e o "quente"!...

Observámos o reboque desaparecer na noite fria e decidimos rumar a sul, até Salir, em busca dum quarto para passar a noite. Pelo caminho parámos num restaurante-gasolineira para atestar a moto. Eram quase dez da noite. Mortinhos por atestar logo ali, também, o estômago, o proprietário não se mostrou muito receptivo à ideia...
- "Ainda têm alguma coisa que possamos comer?"
- "Umas sandes..."
- "Qualquer coisa quente...não se arranja? Restos de sopa?..."
Entretanto surge a esposa-cozinheira...
- "Ela é que sabe..."
Aplicámo-nos convictamente numa "choradinha" e lá se dispôs a cozinhar qualquer coisa. Serviu-nos bifes e batatas fritas, acompanhados por uma bela salada de alface e tomate. Soube-nos a manjar dos Deuses!...
Comemos afincadamente enquanto víamos, na Eurosport, o resumo do Dakar!

Satisfeitos, e mais quentes :), progredimos até Salir. Lá chegados não ficámos satisfeitos, decidimos continuar até Loulé. Lá teríamos mais escolha para alojamento.
Passava das 23:00 quando encontrámos uma residencial. Foi a escolhida pela sua qualidade mais evidente: foi a primeira que apareceu! :)
Instalámo-nos, lavámo-nos, aquecemo-nos e desvanecemos progressivamente num sono profundo, reconfortante, merecido... e quente.

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sexta-feira, janeiro 06, 2006

Dia 3: De Serpa a Alcoutim

Conforme combinado, às 8:30 estávamos na rua a carregar as motos. Chuviscava insistentemente e parecia que teríamos pela frente um dia hostíl às nossas intenções.

Após o pequeno-almoço, rumámos a sul através de largos estradões até às margens do Guadiana. Enveredámos depois por trilhos barrentos bem à moda de Serpa que, mais uma vez, não nos levavam a lado nenhum. As discrepâncias entre o terreno e as cartas eram grandes e não conseguimos encontrar alternativas.


Após mais de uma hora às voltas nas ladeiras de barro, muito peganhento devido à chuva antecedente, o material acusava já o esforço... a motos aqueciam e as rodas da frente já começavam a bloquear.
Numa subida íngreme, coroada no topo por um planalto cultivado, foi necessário proceder a uma inversão de marcha delicada. Enquanto efectuava a manobra no espaço exíguo, pontuado por enormes calhaus, ouvi um estalo tenso e perdi a tracção. "Pronto, parti a corrente!..." - exclamei.

Parei a moto e analisei a trajectória e o estrago. Passava junto a um enorme calhau e, felizmente, não tinha partido a corrente. A protecção de alumínio tinha cedido à pressão contra a pedra e empurrou literalmente a corrente para fora da cremalheira.
Enquanto a colocava novamente no sítio o Nuno, que andava por ali às voltas, perdeu a embraiagem na subida e viu-se forçado a entrar pelo campo lavrado a dentro. Bloqueou a roda da frente com barro e pronto, lá teve de analizar a massa consistente bem de perto :) ...


Finalmente, conseguimos retirar as motos daquela pasta impiedosa e proceder à desmontagem e limpeza dos guarda-lamas.


Decidimos então, em boa hora, regressar a Serpa e procurar melhores caminhos para sul. Por aqui estava visto que não iríamos a lado nenhum. Eram 11:30 e ainda andávamos nos arrabaldes de Serpa...
O céu lavou a cara e deixou o Sol penetrar. O dia estava agora agradável e luminoso. Enveredámos pela estrada asfaltada em direccção a S. Brás, sondando as bermas em busca de um desvio para o campo.
Poucos kilómetros adiante, um caminho frequentado levou-nos pelos montes junto ao rio.


Mas não por muito tempo. Recentes alterações nas propriedades vedaram todas as saídas daquele local e vimo-nos forçados a regressar ao asfalto. Tentámos praticamente todas os caminhos que divergiam da estrada, mas sem grande sucesso.
E com isto chegámos ao estradão que nos leva ao Pulo do Lobo.
A enrolar punho por ali fora, ia para meter a quarta... BOIIING! - "Epaaaah!..." - lá se foi o cabo da embraiagem.


O mal era antigo. O cabo foi-se desgastando pela fricção na boca da bicha e eventualmente cedeu. "Aqui não ficamos!" - e saquei do rolo de arame.
Com a preciosa ajudo de dois hábeis "tecelões", lá improvisámos um cabo novo!



Retirado que estava o antigo, o cabo novo deslizou pela bicha adentro sem problemas! Arcaicamente instalado, estava pronto a cumprir a sua função: tirar-nos dali!



Passados poucos momentos e estávamos de novo em andamento. Não muito seguros da eficácia do improviso, decidimos retomar a estrada para Mértola. Lá tentaria remediar melhor o contratempo.
O céu entretanto vestiu-se de nuvens e a aproximação à vila fez-se já debaixo de aguaceiros. Eram duas da tarde.


Recolhemo-nos a um restaurante para repôr energias e disfrutámos do saboroso lombo assado e de sopas de peixe do rio. Iguarias...


Após o repasto, saí em busca duma oficina de motorizadas para comprar um cabo. Rapidamente encontrei o que procurava e bastaram 10 minutos para solucionar o problema.
Deixámos Mértola e dirigimo-nos para sul junto ao Guadiana. A paisagem fenomenal encantáva-nos ao dobrar de cada esquina. O Guadiana pacificamente seguia o seu rumo para o mar e nós pretendiamos seguir-lhe as voltas.


Progredíamos num estradão bem marcado que nos levou até uma propriedade fechada e desolada. Atravessámos o portão aberto e continuámos pelo caminho até junto dos casarões em ruínas. Ali, o caminho desvanecia e perdia-se numa descida pedregosa. Não hesitei e fiz-me à descida. Eis que surge uma vedação, repentinamente, no meio da descida e, sem grande margem para travagens, passei-lhe por cima!


A descida morria nas margens de uma ribeira e, pacientemente, analisámos as hipóteses de a atravessar incólumes.
No entretanto, surgiu uma pickup no topo da subida e lá de dentro saiu um homem exclamando: "Vô fechar o portaummm!"
Perguntámos, ligeiramente encavacádos pelo estado da vedação, se dava para atravessar a ribeira e se eventualmente haveria saída do outro lado, ao que respondeu: "Nã sei... eu name meto aí com a carrinha! Nã sei o cá além daquele lado! Se quizerem voltar para trás táli uma passagem piquena das ovelhas junto ao murro pronde podem sair... eu vô fechar o portão!"
Enfiou-se na pickup e ficou a apreciar o espetáculo...
"Belo!" - exclamámos.


Como não há àgua que meta medo aos nómadas, só havia um caminho: para a frente! Sem preocupações com a possibilidade de não haver saída do outro lado do vale, decidimos: "Aqui não ficamos!" - O Guadiana segue o seu rumo e nós queremos ir com ele. Haja o que houver!
Sendo a AT a moto com a entrada de ar mais elevada, coube-me a tarefa de avaliar a real profundidade da ribeira. Apesar de haver um pequeno fundão a meio, e da saída ser um pouco íngreme em areão solto, passei sem dificuldade.


A frente da moto "abria" as àguas e, com os pés nos apoios, nem molhei os joelhos. Poderiam agora progredir as DR's sem receio.
O ataque à ribeira era também complicado, pois a recta mais segura para a transpôr iniciava-se num ponto da margem muito arenoso e "vedado" pelos ramos de uma velha àrvore.
O Nuno resolveu então ser o primeiro a "testar" a DR...




E só faltava o Daniel, que estava a sentir algumas dificuldades em manobrar a "Suzy" sobre o areão, agora sozinho do outro lado.


E, evidentemente, necessitaria de ajuda a colocar-se no melhor ponto de transposição. Ainda estava eu a pensar no assunto, já o Nuno andava dentro de àgua para ir ajudar o Daniel!


Este é o inigualável espírito deste grupo de amigos!
Depois de devidamente posicionado, o Daniel enfrentou a sua travessia sem nenhum problema.



E lá teve o Nuno que se "demolhar" novamente na àgua para finalmente averiguarmos para onde seguiríamos a partir dali. E haverá alguém que afirme que este sorriso não pertence a quem é apaixonado pelo que faz?


Alguns metros adiante encontrávamo-nos num velho pomar abandonado. As àrvores de fruto mortas, cadavéricas, negras; as ruínas de algumas casas, os muros de pedra, tudo envolto na erva alta. Quando teria alguem ali estado pela última vez? Não sei precisar...



Após reconhecermos o local a pé, determinámos que a melhor saída seria arranjar forma de progredir pela encosta cima ao encontro de um caminho marcado na carta, se ainda existisse.
O terreno era muito escorregadio. A erva verde, o solo barrento e molhado, os calhaus soltos do tamanho de meloas, as valas rasgadas pelas enchurradas e a encosta inclinada deram-nos trabalhos para quase uma hora. Uma a uma, as motos lá foram progredindo até ao topo do monte.







No topo encontrámos, de facto, vestígios do que teria sido em tempos um caminho! Prosseguimos já com o dia a despedir-se atrás dos montes e, pouco depois, iniciámos a espectacular "noturna" pela serra que nos levaria até Alcoutim, interrompida apenas pela necessidade de cruzar o Vascão pelo asfalto.
Pelas 21:00, estávamos à porta da Pousada da Juventude onde decidimos passar a noite. Plantada na encosta com um vista suberba sobre a vila, a pousada sumptuosa estava praticamente vazia. Não sei como se justificam os investimentos neste país.


Depois de instalados e lavados, descemos à vila para jantar e acabámos por sucumbir a um cozido de grão magistral!
Regressámos à pousada e delineámos grosseiramente o dia seguinte, já por terras algarvias. Despedimo-nos do Alentejo com um "até já", pois as inesquecíveis paisagens de que disfrutámos são apenas uma gota de àgua no imenso caudal de um Guadiana abundante que queremos, em breve, revisitar.


Oxalá permitamos ao Alentejo conservar todo o seu esplendor; oxalá saibamos resistir ao apelo do turismo de massas, selvagem e ambientalmente desinteressado; oxalá sejamos capazes de preservar as maravilhas ocultas que o Alentejo nos revela atrás de cada colina; oxalá possamos mostrar aos nossos netos os mesmos caminhos por onde um dia, felizes, enveredámos; "inch'Allah"...

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